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TDC: entenda o transtorno que faz sofrer quem busca a ‘beleza perfeita’

A busca pelo peso ideal acompanhou a publicitária Michele Nicodemo, 29 anos, desde a adolescência. Em crises emocionais, ficava sem comer, teve episódios de vômitos e uso de laxantes. A obsessão a levou aos 48kg. Mesmo com 1,68m de altura, não se via magra.

Quando buscou ajuda profissional entendeu que seu transtorno alimentar estava associado a uma condição que até então desconhecia: o Transtorno Dismórfico Corporal (TDC). “Quem sofre desse distúrbio não se enxerga como é e tem vergonha de falar sobre isso. Não é algo simples de explicar, por isso, ainda é um tabu: as pessoas não têm coragem de assumir. Existe um preconceito igual ao que rodeia a saúde mental”, relata.

Hoje ela compreende os caminhos que a levaram aos seus hábitos alimentares irregulares e sofrimento com o físico. O TDC é a condição psicológica que altera a percepção e imagem corporal e consiste em preocupação exagerada com a aparência. O indivíduo desenvolve uma visão irrealista do próprio corpo, cria obsessão por um defeito (que pode ser imaginário) e procura incessantemente pela correção. “Esse distúrbio está descrito como patologia no DSM-5 [Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais 5a edição], que classifica as doenças psiquiátricas”, especifica cirurgião plástico Fabio Nahas.

“O que acontece é que o paciente considera uma parte do corpo muito feia, e na verdade não é. Mas fala daquilo como causa de sofrimento, é brutal”, exemplifica o também professor na Universidade Federal de São Paulo. Há um aumento significativo desse diagnóstico, o que preocupa a ala médica. Em estudo liderado por Nahas, 300 candidatos que buscavam intervenções fizeram o Exame de Transtorno Dismórfico Corporal. As taxas de prevalência de sintomas em quem desejava abdominoplastia, rinoplastia e lifting facial foram 57%, 52% e 42%, respectivamente.

Na era das redes sociais, a possibilidade de editar intensamente a própria foto ou vídeo potencializa a distorção. No entanto, a doença foi descrita pela primeira vez em 1886, pelo psiquiatra italiano Enrico Morselli. No popularesco ciberespaço, ganhou o pejorativo nome de ‘síndrome da feiura imaginária’. “É apelidar e diminuir o que a pessoa passa e sente. Torna-se ofensivo, é como dizer que Covid-19 é uma ‘gripezinha’”, adverte Michele.

A força da mídia nos números desse transtorno foi objeto de outra pesquisa do especialista Alexandre Kataoka, diretor do Departamento de Defesa Profissional da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica. Ele avaliou 38 pacientes do sexo feminino — com idades entre 19 e 57 anos — que passaram por intervenções. Do grupo, 17 mulheres, ou seja, 44,74% admitiram ter a mídia como influência em relação a sua imagem corporal e apresentaram sintomas de TDC. “ A maioria não aceita que tem o transtorno e acha normal a utilização dos filtros exageradamente com a desculpa de que ‘todos fazem’”, avalia. “É de suma importância a identificação correta desses pacientes a fim de protegê-los de possíveis insatisfações futuras”, frisa.

“O paciente com TDC considera uma parte do corpo muito feia, e na verdade não é. Mas ele fala daquilo como causa de sofrimento, é brutal.” Fabio Nahas, cirurgião plástico. “As pessoas se comparam e trazem para o consultório fotos como referência de outros retratados em luzes ideais, incidências otimizadas, filtros e retoques digitais”, narra Gabriela Schwarzmann, cirurgiã plástica. “Costumo perguntar: ‘Quantas vezes você encontra na rua esse tipo de beleza? Você encontra numa festa ou no evento social tamanha perfeição? Não se compare ao inalcançável’”, diz a profissional associada da Allergan Aesthetics.

A empresa líder em tratamentos estéticos conduziu um levantamento sobre a aplicação excessiva de filtros. Entre maio e junho de 2022, foram ouvidos 650 cidadãos de oito capitais do Brasil, sendo 24% homens e 76% mulheres, entre 18 e 50 anos. Um resultado impactante foi que 94% concordaram que o uso exagerado dos filtros pode fazer com que uma pessoa deixe de gostar de sua figura “real” e passe a querer a “virtual”. O alerta fez a farmacêutica criar a campanha Assuma Sua Imagem para conscientizar que “não existe um padrão de beleza único”, como define Camila Cazerta, diretora médica afiliada da Allergan.

Quando identificado, o TDC tem tratamento para a qualidade de vida com Terapia Cognitiva-Comportamental. “Nesse distúrbio, a pessoa nunca atinge a aparência que gostaria de ter, é um enorme sofrimento. Trabalhamos na diminuição e alteração das convicções para que ela comece a enxergar seus valores em relação a autoestima e aceitação”, explica a psicóloga Larissa Fonseca. “O paciente começa a distinguir que vê uma distorção no espelho, entende que não tem aquela feiura, passa a deixar de ter medo do julgamento e percebe quem, efetivamente, é”, prossegue. “Temos que desafiar cada pensamento negativo. O autoamor vai além do pixel e do like.”

Redação com a Revista Istoé- Texto compartilhado. Foto-Divulgação

E-mail: redacao@blogdellas.com.br

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