Realidade dos municípios e Pacto Federativo – Por Maurício Costa Romão*

 

Um dos pontos importantes da pauta da Confederação Nacional dos Municípios, na XXIV Marcha a Brasília, é a questão do Censo Demográfico 2022. Não sem razão. As prévias do Censo revelaram que cerca de 2.300 municípios brasileiros (41% do total) apresentaram população menor que a registrada no levantamento de 2010.

É a consequência do padrão demográfico brasileiro de forte redução da fecundidade, combinada com o fenômeno da emigração e a ocorrência da pandemia da covid-19, que aumentou o número de óbitos e diminuiu o de nascimentos, reduzindo o crescimento vegetativo do país.

O problema se reveste de gravidade porque a distribuição dos recursos do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) é feita de acordo o número de habitantes dos municípios e pode haver impactos negativos nas finanças dos que estão tendo decréscimos populacionais, com imediata repercussão na prestação de serviços às comunidades locais. A participação relativa de cada município na distribuição do FPM tem permanecido inalterada desde 2019 no aguardo dos resultados finais do Censo 2022. Entretanto, faz-se mister reconhecer que, salvo em alguns casos, a realidade demográfica dos municípios desfilada nas prévias populacionais não deve se alterar significativamente comparada com o produto do Censo 2022.

Em assim sendo, muitos dos municípios que têm experimentado decrescimento de suas populações vão mudar para faixas de coeficientes menores e, portanto, por imperativo constitucional, receber menos recursos nos próximos exercícios.
Urge, então, se pensar numa trajetória de médio e longo prazos, com esteio em uma reforma estrutural que apenas um novo pacto federativo pode ensejar.

Nessa esteira, um possível caminho é resgatar alguns tópicos da PEC 188/19, que esboçava certa reestruturação federativa, mas que acabou arquivada na legislatura passada devido em parte as estéreis refregas ideológicas que a impediram de prosperar. São vários os pontos da PEC que merecem ser rediscutidos, naturalmente com sugestões vocacionadas para aprimorá-los, através de ampla discussão na sociedade.

Um desses pontos, polêmico, é certo, mas que precisa ser enfrentado, é a extinção de municípios de até 5.000 habitantes que não demonstrem sustentabilidade financeira e sua consequente incorporação a um município limítrofe, conforme reza o art. 15 da ADCT (p. 15 da PEC).Apenas à guisa de ilustração desse tópico, tome-se o exemplo pedagógico dos municípios da Paraíba em termos populacionais (vide tabela). Nota-se, ab initio, que nada menos que 111 municípios do estado – metade do total de 223 – têm menos de 7.000 habitantes, com média de residentes de 4383 pessoas.

Pode-se constatar ainda que são 69 (31% do total) as localidades de menos de 5.000 habitantes, das quais 24 se encontram no intervalo de 1.000 a 3.000 residentes. A propósito, nestes 69 municípios, referências daqueles passíveis de extinção pela norma sob invectiva, os cargos eletivos chegam a 759 (621 vereadores e 138 prefeitos e vice-prefeitos) e os funcionários públicos, grosso modo, somam 1.725, a maioria em cargos comissionados.

Não há necessidade de desfilar números e exemplos da tragédia socioeconômica e fiscal que se abate sobre esses entes federativos menores. Seu retrato fiscal, diga-se, já é conhecido: depende praticamente de transferências governamentais (FPM, ICMS e outras), gasta mais da metade das receitas com pessoal, a receita própria (ISS, IPTU, etc.) é irrisória ou inexistente e, tirando as despesas com pessoal, custeio, dívida e outros compromissos, sobra muito pouco ou nada para os gastos com investimento.

Fica evidente que o debate sobre distribuição de recursos entre entes federados não pode continuar no nível periférico de agora. É hora de encaminhamento disruptivo, sob pena de não o promovendo perpetuar o calamitoso quadro atual.

*Maurício Costa Romão é Ph.D. em economia pela Universidade de Illinois, nos EUA. Colabora com textos para o blogdellas. mauricio-romao@uol.com.br.

E-mail: redacao@blogdellas.com.br

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