Racismo e inveja –Por Tostão*

 

Os xingamentos racistas ocorridos na Espanha contra Vinicius Junior não foram casos isolados, e sim uma manifestação coletiva. O árbitro deveria ter encerrado a partida. A Fifa, a Liga Espanhola e os governos precisam tomar duras atitudes para coibir essa vergonha. O racismo é antigo e mundial, muito frequente nos estádios de futebol porque as pessoas na multidão não se sentem responsáveis por seus atos. O culpado é o grupo.

O ódio a Vinicius Junior é mais que um criminoso preconceito racial. É também uma inveja a um jovem negro, sorridente, bailarino, mentalmente forte, um craque, um artista capaz de fazer coisas inimagináveis com a bola.

A chave e a fechadura

Um leitor discordou de minha opinião de que o Manchester City é um dos grandes times da historia. Ele argumenta que a equipe não tem um Pelé, como o Santos, um Di Stefano, como o Real Madrid, nem um Messi, como o Barcelona. A minha opinião é mais coletiva, embora o City tenha grandes jogadores, como o De Bruyen, um craque completo, para ficar na história, pois marca, cruza, passa e finaliza com precisão. Na prancheta, o City é uma equipe parecida com muitas outras. Joga com a linha de quatro defensores, um volante centralizado, um meio-campista de cada lado, dois atacantes pelos lados e um centroavante. Quando a bola rola, mostra as diferenças. A equipe domina os pilares importantes do futebol moderno, a compactação entre os setores, a pressão para recuperar rapidamente a bola e uma excepcional e encantadora troca de passes, acelerando em direção ao gol no momento certo.

Nos anos anteriores, Guardiola, quando o time tinha a bola, deslocava um dos laterais para o meio para organizar as jogadas ao lado do volante, deixando atrás uma linha de três defensores. Neste ano, é o zagueiro Stones que se adi- anta para ser um jogador de meio campo. Dependendo do momento, Stones recua e volta a ser um zagueiro. O sistema defensivo melhorou bastante neste ano e é a equipe que menos sofre gols na Europa. O time é muito for- te na defesa e no ataque.

Por que os adversários não conseguem anular a troca de passes do time desde a defesa?

Nos últimos dias, vimos o Flamengo e o Botafogo não deixarem o Fluminense trocar passes desde a defesa, a principal característica da equipe. Outros times vão tentar fazer o mesmo e o técnico Fernando Diniz terá que arrumar soluções. Poderia telefonar para o Guardiola. Dizem que ele, antes de iniciar carreira como técnico, no Barcelona, viajou para a Argentina e ficou vários dias conversando com Bielsa, seu mestre.

Por que o Manchester City geralmente não erra passes e não perde a bola? O passe é dado para o companheiro perto do marcador, que, quando tenta desarmá-lo, a bola já está com outro. Assim, sucessivamente, o City avança com a bola em direção ao gol. É o domínio do espaço e do tempo. O City vai enfrentar o Manchester United na final da Copa da Inglaterra e a Internazionale na final da Liga dos Campeões. É o favorito nas duas competições, mas não será nenhum absurdo se for derrotado, por causa da relatividade do futebol.

O jogo, além de técnico, tático, físico e emocional, é uma aventura, uma tentativa de descobrir a chave que vai abrir a fechadura. Muitas vezes, a descoberta ocorre por acaso. Assim é a existência. O mundo se abre e se fecha sem avisar. A ciência existe para diminuir a distância entre o imprevisível e a possibilidade concreta, planejada.

*Tostão, cronista esportivo, grande craque, tendo participado como jogador das Copas de 1966 e 1970. É formado em medicina / O oportuno texto é compartilhado da Folha de São Paulo, nesta quinta, 25.05.2023.

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