Por que os nãos ditos pelas mulheres não são aceitos? Por Ana Fontes*
Por que os nãos ditos pelas mulheres, em qualquer circunstância, não são aceitos? Como um advérbio de três letrinhas é tão desafiador de ser dito para nós, mulheres. O não em uma tarefa que não é sua implica em você ser rotulada como chata; o não em uma cantada implica em você ser considerada “mal amada”; o eu não posso, implica em você não ser capaz. O nosso não, seja qual for o destino dele, não é devidamente respeitado.
Ensinadas a ser passivas, complacentes, agradáveis ou preocupadas com o bem-estar dos outros, dizer não é um desafio gigante para mim, e imagino que também o seja para você. No entanto, venho trabalhando nisso. Recentemente, li um texto sobre a “síndrome da mulher boazinha”, que basicamente é: a mulher coloca as necessidades dos outros acima das suas, na maioria das vezes, em detrimento de suas próprias necessidades, vontades e desejos. Isso está relacionado à nossa dificuldade em dizer não e à constante busca pela aprovação dos outros. Se identificou? Eu mais do que gostaria.
A verdade é que o “não” não nos foi concedido. A gente o utiliza e lida com as consequências depois. Aceitar mais demandas, projetos e reuniões fez com que eu me afastasse mais da minha família, ficasse um pouco mais estressada e consideravelmente mais cansada. Percebo que, para muitas de nós, o “não”, ao contrário dos homens, é interpretado como arrogância e prepotência.
Na maternidade, o ato de dizer “não” nos transforma na mãe chata; no âmbito empresarial, somos vistas como chefes megeras; e em um romance, passamos a ser encaradas como alguém que está “fazendo doce”.
Além de empregar muitos adjetivos injustos, o “não” da mulher não é levado a sério. Quantos casos são noticiados de feminicídio de homens que não aceitam o fim do relacionamento? Ou daqueles que forçam situações porque não compreendem que o não é não? Hoje, exercito, recusando propostas que não se encaixam no meu dia ou simplesmente porque não estou afim.
Dizer “não” sem muitas explicações é uma maneira poderosa de afirmar meu espaço e respeitar meus limites. Afinal, não é não!
*Ana Fontes É empreendedora social e fundadora da RME (Rede Mulher Empreendedora). Vice-presidente do Conselho do Pacto Global da ONU Brasil e membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável da Presidência da República. Texto compartilhado da Folha de São Paulo. Foto-Divulgação.
E-mail: redacao@blogdellas.com.br