Oscar 2023: ‘Close’ investiga a masculinidade atual

– Filme do belga Lukas Dhont levou o Grande Prêmio do Júri no Festival de Cannes de 2022 e foi indicado a melhor Filme Internacional para a disputa do Oscar –

Um filme que faltava. Um debate que exige refleção. Um tema ainda meio tabu. Um filme , portanto, preciso e bem-vindo.
A alcunha dada pela crítica de cinema do GLOBO Susana Schild ao ator Eden Dambrine não poderia ser mais exata: o protagonista de “Close” é, aos 14 anos, uma doce fera. Desde a última quinta-feira (2) nos cinemas (e a partir de abril no Mubi), o filme do belga Lukas Dhont levou o Grande Prêmio do Júri no último festival de Cannes, teve apresentações disputadas em São Paulo no mais recente Festival Mix Brasil e é indicado ao Oscar de melhor longa internacional.

“Close”é sobre a amizade de dois meninos de 13 anos, Leo (Dambrine) e Rémi (Gustav De Waele), com seus abraços, toques, tema raramente visto nas telas. A fisicalidade, neste caso, é um tabu, diferentemente de quando se mostra a intimidade de meninas. Queria ir a fundo nisso, o filme tem muito de mim— diz o diretor de 31 anos, que é gay, em passagem por São Paulo. “Close” se revela especialmente por meio dos gestos e olhares do Leo vivido pela revelação Dembrine. Como o título sugere, a câmera de Dhont acompanha a “doce fera” bem de perto.

Primeiramente, em um verão marcado pelas cores vivas do cultivo de flores no Flandres belga (embora as filmagens tenham se dado na parte holandesa), pelos risos, abraços e pelas camas divididas pelos meninos cansados após brincadeiras que parecem não ter fim. Depois, quando os meninos adentram o ensino secundário, no questionamento direto das alunas e no bullying dos colegas interessados no que parece ser um namoro homoafetivo. E em como cada um reage à violência: Leo se afasta de Rémi, enquanto este vive a depressão, com resultados trágicos. Ao entrarem na adolescência, a conexão dos dois é questionada, julgada, inclusive por eles mesmos. “Close” não é um filme sobre sexualidade ou homoafetividade, mas uma investigação sobre o ideal de masculinidade na sociedade ocidental contemporânea. De certa forma, é outro lado do que eu já havia feito com “Girl” — diz.

Antes de “Close”, Dhont foi aclamado por seu primeiro longa, que no Brasil foi batizado de “O florescer de uma garota”. O filme saiu de Cannes com três troféus: Melhor Filme de Estreia, Prêmio da Crítica e a Queer Palm (voltada para produções LGBTQIA+). Nele, traduz sonhos e pesadelos de Lara, uma menina trans que deseja ser bailarina, papel do ator e bailarino Victor Polster. — Aquele filme foi um estudo sobre a feminilidade. O cinema foi meu plano B. Minhas paixões eram a dança moderna e o balé. Mas quando tinha uns 12 anos ouvi seguidas críticas de que minha dança era “de menina”, a maneira como eu me movimentava não era percebida como masculina o suficiente — conta o diretor. — Infelizmente, naquele momento, não tive a coragem de dizer “e daí?”. Fiquei muito mal, e só voltei a focar na criação quando minha mãe, preocupada, me deu uma câmera de presente. Nunca mais parei de filmar.

“Close” se revela menos nos diálogos, curtos, do que nos silêncios, movimentos, olhares e, claro, na coreografia dos protagonistas. Dhont conta ter se influenciado pelos “coreógrafos” do cinema, diretores que usam os movimentos do corpo, de forma intencional, para contar uma história. E cita os belgas Chantal Akerman (de “Jeannie Dielman”, de 1975) e os irmãos (Luc e Jean-Pierre) Dardenne, mas também “Elefante” (2003), de Gus Van Sant, com a câmera que se move constantemente para revelar os traços de um atentado brutal a ser cometido. Meu sonho interrompido da dança está hoje a serviço do cinema. Vejo um filme como uma coreografia, não como uma sequência de diálogos. Os corpos, os movimentos, as cores, a estética, pesam mais do que palavras a serem ditas — diz Dhont.

Não é dito, mas decididamente vivido o ato de violência que inicia o fim de “Close”. Há uma cena em que os pais de Gustav pedem que ele não se tranque em qualquer ambiente da casa. Há o choque com seu desaparecimento. E o luto do depois. Além do ensaiador, psicólogos especializados em jovens foram destacados para o set. Mas a gente não se dá conta do quanto a depressão e seus efeitos mais duros estão presentes nas vidas dos adolescentes. Não foi preciso mergulhar, explicitamente, na tragédia— diz. Além da delicadeza com que a história é tratada, para “Close” de fato funcionar era preciso que Eden e Gustav se entrosassem de fato. Eden foi selecionado por Dhont logo após o diretor vê-lo falando animado com os amigos, em uma viagem de trem, mas sem ouvir sua voz. Estava com fones e ouvindo Max Richter bem alto mas não consegui parar de prestar atenção naquele menino com olhos enormes e muito expressivo. Parecia que havia todo um mundo que ele queria dividir com você — conta. — Já Gustav foi selecionado em uma de nossas centenas de audições em escolas públicas belgas. Ele era quieto e tinha algo misterioso, a ser revelado. O oposto ideal.

Os meninos não ensaiaram cenas de imediato. Simplesmente passaram tempo juntos, na praia, fazendo e comendo panquecas no café da manhã, até ganharem a intimidade necessária para que Dhont começasse a filmar.Foi como se eles também tivessem nos escolhido, e, para este filme, isso era essencial — diz o diretor.

O filme é atual. Oportuno o debate que propõe. Necessário.

Redação com veículos e assessoria- Foto-Divulgação-O Globo

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