O trabalho invisível – Por Daniela Rorato*
O início de maio marca o Dia do Trabalho e aproveito a data para sugerir uma reflexão sobre as mulheres “invisíveis” que realizam trabalhos igualmente invisíveis para o sistema: as cuidadoras.
Sim, quase 80% do trabalho de cuidar é executado por mulheres e a discussão no mundo cresce em torno do que conceituaram como “care economy”, definindo como “economia do cuidado” o trabalho invisibilizado e não remunerado, exercido majoritariamente por mulheres. Esta atividade envolve desde tarefas para manutenção do lar até o zelo com crianças, idosos, pessoas doentes ou com deficiências.
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) contabilizou que essas jornadas invisíveis de cozinhar, limpar, cuidar de crianças etc., somariam cerca de 11 trilhões de dólares por ano se fossem pagas.
A geografia social dessa mulher é ignorada ainda pelo sistema previdenciário, uma vez que a mulher cuidadora não tem sua condição reconhecida ainda aqui no Brasil.
Discutimos muito isso em rodas de mães cuidadoras, de filhos com deficiência ou doenças raras, já adultos. E do quanto ela é abandonada pelo sistema pois não existe suporte nem política pública para ela.
Esta equação é cruel e econômica: ela não tem onde deixar seu filho para ingressar em um trabalho formal (creche é só até seis anos, filhos adultos não frequentam escolas e não existem instituições). Então, se ela tem como pagar alguém para cuidar do filho, pode sair para trabalhar. Caso contrário, é cuidadora 24h. Sua saúde mental também não é discutida e ao passar dos anos apresenta doenças secundárias, a privação de vida social, escassez e solidão acarretam transtornos mentais, mas ninguém está preparado e/ou interessado para ter essa conversa ainda. Tudo isso sem direito a auxílio cuidador, a aposentadoria, nada. Ela ainda é ninguém para o sistema socioeconômico, sendo que seu trabalho ajuda esse sistema a lucrar.
Nem existe a palavra “anja”, mas certeza de que ela seria uma (contém ironia). O povo chama de “guerreira” mesmo. Adoram esses adjetivos que só as desumanizam, afinal, quem gosta de vir ao mundo para viver em guerra?
Já percebeu que substantivos sobrecomuns que representam um só gênero, na maioria das vezes é escrito em masculino?
Curioso refletir sobre o fato de não existir a palavra “anja”, mas existir a palavra bruxa. Que a fraternidade sempre foi masculina pois a palavra vem do latim “Frater”, que significa “irmão”. O feminino de Frater é “Soror” no mesmo latim, mas só milhares de anos depois se fala dessa tal sororidade que muita gente ainda nem sabe o que é, e tampouco pratica.
Eis que como uma bruxa, neste dia tão precioso eu venho aqui lembrar minhas sorores, irmãs, que lutam e suam no invisível ( e sem feriado remunerado).
Torcendo para que este trabalho invisível não seja mais uma injustiça queimada na fogueira.
*Daniela Rorato (Empreendedora social e ativista em defesa da mãe cuidadora e das pessoas com deficiências)
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