O Desafio da Escoliose no Brasil – Por Carlos Romeiro*

 

Escoliose é uma doença que promove uma alteração no alinhamento da coluna vertebral durante o estirão de crescimento da adolescência. Acomete cerca de 3% da população com uma predileção por meninas numa proporção de 7 para 1 em relação aos meninos.

É um problema de saúde pública nacional, mas em Pernambuco a situação parece ser muito mais preocupante. Não temos sequer dados demográficos e epidemiológicos sobre quantas crianças e a quanto tempo estão esperando na fila para o tratamento cirúrgico.

Quando não tratada na janela temporal ideal, a escoliose leva a deformidades incapacitantes para atividades de vida diária além de poder promover alterações em sistemas essenciais do corpo humano, como o cardíaco, pulmonar e neurológico.

Em 2019, foi fundada uma associação sem fins lucrativos, o Brazilian Spine Study Group (BSSG), por médicos de diversos estados brasileiros, que promove um projeto – o Mude a Curva. O movimento realiza mutirões gratuitos itinerantes de cirurgias de escoliose em pacientes que aguardam na fila do SUS. Até hoje 147 crianças foram operadas nos estados de Pernambuco, Maranhão, Piauí, Goiás, São Paulo e Amazonas. A junção de toda equipe médica voluntária do Mude a Curva com a doação de todos os materiais necessários para as cirurgias por indústrias multinacionais e a disponibilidade de leitos e salas de cirurgias por parte de hospitais públicos receptores do movimento, permite que essas crianças sejam beneficiadas.

Através das redes sociais do projeto, dezenas de crianças e seus familiares pedem ajuda e contam um pouco de sua história. Os dados são alarmantes. Em pouco mais de duas semanas de abertura de um banco de cadastro de pacientes para mapeamento epidemiológico da fila de espera em Pernambuco para cirurgias de escoliose, cerca de 170 crianças preencheram os formulários. Cerca de 10% destes provenientes de outros estados. Muitos há mais de 8 anos aguardando seu procedimento. E isso tende a piorar, uma vez que entram mais crianças na fila do que o sistema é capaz de operar. Apenas dois serviços no estado inteiro operam escoliose pelo SUS de forma rotineira, o Hospital Getúlio Vargas e o Hospital Otávio de Freitas. No entanto, mesmo juntos não conseguem sequer operar 8 pacientes por mês. E não sabemos quantos entram, mas se calculássemos pela prevalência estimada, arrisco falar que entre 15 a 20 novos pacientes são diagnosticados com a enfermidade por mês.

Outro grave problema é que muitas crianças sequer conseguem marcar a consulta inicial de avaliação da escoliose, perdendo o tempo ideal para início do tratamento conservador – que só é eficaz nas fases iniciais da doença. Mas mesmo se fossem diagnosticados nessa fase, o SUS pernambucano não dispõe de estrutura para acolher essas crianças e prover o tratamento fisioterápico e ortótico (com utilização de coletes) ideal.

Como membro fundador do Mude a Curva, convido a sociedade civil pernambucana e também a classe política para o debate: Como podemos tratar essas crianças de forma adequada e evitar sequelas irreversíveis? Alguns políticos como o vereador recifense Tadeu Calheiros e os deputados estaduais Fabrízio Ferraz e Claudiano Filho, demonstraram simpatia com o projeto e vontade de intermediar o diálogo com o poder público sobre a possibilidade de Pernambuco receber uma sede fixa do Mude a Curva. Sabemos que isso não é a solução definitiva para a escoliose no estado, mas já seria o primeiro passo. Sem a discussão e vontade política continuaremos a condenar nossas crianças com escoliose à incapacidade.

*Carlos Romeiro, cirurgião ortopedista, membro fundador do Mude a Curva. Integrante da Sociedade Brasileira de Coluna (SBC). Gestor de ortopedia no Hospital Santa Joana e Esperança Olinda. Texto colaborativo- Foto: Divulgação.

E-mail: redacao@blogdellas.com.br

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