Luísa Sonza e a ode ao amor romântico- Por Mariliz Pereira*
A cantora não disfarça o querer, não tem medo de parecer clichê e desperta em muitos de nós a nostalgia da promessa de um amor gostoso de se viver.
Não é só se “arriscar no amor” o que Luísa Sonza faz na letra de “Chico”, que está em modo repetição no meu tocador e no de muitas outras milhares de pessoas.
A cantora se arrisca ao lançar uma música em forma de declaração ao namorado, o tal Chico, onde assume a “cafonice” da monogamia em tempos de relacionamentos abertos. Uma baita ousadia cantar aos quatro cantos o desejo por um único homem, fazer poesia sobre o empenho em viver um romance careta para os padrões do século 21.
Aos menos para os padrões que normatizam os costumes do circuito Botafogo-Vila Madalena. Experimente dizer que vive uma relação hetero-monogâmica-longeva para ser olhada como um avestruz raro que não sabe onde meteu a cabeça.
O amor romântico foi emparedado e vem sendo contestado. Com razão. O que nos foi ensinado vem carregado de excessiva idealização, expectativa de felicidade duradoura, dependência emocional, ciúmes, possessividade, vulnerabilidade emocional, pressão social, além, claro, de exclusividade. Colocado assim, parece uma coisa terrível e é.
O amor com exclusividade e com entrega, deveria ser óbvio, não é só isso. Mas ficou decidido que ceder aos impulsos das emoções provocadas por este tipo de sentimento virou sinal de fraqueza, de submissão, ficou fora de moda, como canta Luísa e como já escrevi há alguns anos sobre a minha própria desgraça de ser feliz e desejar a mesma pessoa há mais de dez anos.
Entregar-se, perder o controle, “apostar na incerteza” não têm mais lugar agora que as relações precisam ser definidas em contratos com cláusulas que protejam possíveis corações partidos, onde a responsabilidade é sempre do outro.
Nos tiraram a possibilidade de nos “arriscar”, como Luísa diz estar disposta por sua história com Chico, porque aparentemente ficaremos assim blindados de enfrentar desilusões. O “ninguém é de ninguém” é exaltado como a receita para as dores de amor.
Luísa vai na contramão, ainda que tenha bebido da fonte de outro Chico, o Buarque, que tão bem canta o lado trágico do amor romântico. Ela faz do seu “folhetim” uma ode ao amor romântico, quer muito mais do que “uma noitada”, e fascina porque abraça a possibilidade. E a possibilidade de um amor é um dos sentimentos mais inebriantes, mais sedutores, mais até do que a sua realização. Nos apaixonamos pela possibilidade. E, meu Deus, como é bom.
A música “Chico” é sobre o que o amor romântico tem de melhor: entrega, paixão arrebatadora, desejo, promessa, expectativa, sem os medos do dia seguinte, sem a certeza de um futuro. Ao dizer que é “dessas mulheres de se apaixonar”, Luísa deixa claro que quer um amor intenso, inteiro e não pela metade, e muito menos dividido. Muda de cidade, toma partido, se pinta, quer encantar.
Luísa não disfarça o querer, não tem medo de parecer clichê. E desperta em muitos de nós a nostalgia da promessa de um amor, se não grande, gostoso de se viver. Ela nos lembra que talvez a coisa mais moderna nos dias de hoje seja amar apenas uma pessoa. Ainda que seja uma de cada vez.
*Mariliz Pereira Jorge é Jornalista e roteirista de TV. Escreve para a Folha de São Paulo. Texto compartilhado pelo Blogdellas.
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