Garantia de direitos para pessoas trans passa pelo debate público – Por Anne Caroline Fernandes*

 

Voto, saúde, liberdade de expressão: tudo aquilo que hoje consideramos direitos básicos foi historicamente conquistado através de uma constante pressão dos mais diversos grupos sociais – basta pensar no movimento das Diretas Já, por exemplo, ou os protestos de 2013 que pediam o congelamento das tarifas de ônibus em diversas cidades brasileiras. Hoje, esse panorama não é diferente.

Pautas sociais, principalmente aquelas que envolvem processos de equidade ou grupos minoritários, requerem mais do que uma regulamentação para serem efetivamente implementadas no cotidiano. É preciso que haja um debate público constante para que sejam socialmente aceitas e reiteradas, garantindo os direitos conquistados na prática.

Aproveitando o Dia Nacional da Visibilidade Trans, celebrado em 29 de janeiro, um exemplo muito claro dessa dinâmica são as conquistas da população transgênero, como o direito ao nome social: apesar da alteração do nome e do sexo no registro civil ser um direito desde 2018, a compreensão do que é o nome social em si e a utilização do mesmo em espaços públicos – como unidades de saúde e entes burocráticos do Estado – assim como o reconhecimento do indivíduo como ele se apresenta, ainda não é uma realidade no país.

Isso porque a lei em si, isoladamente, não traz mudança no imaginário social. O Brasil tem uma cultura conservadora e também muito transfóbica, que fica clara quando vemos que há 13 anos seguidos o país se mantém como o que mais mata pessoas trans e travestis no mundo, de acordo com o relatório da Transgender Europe (TGEU). Sem que haja essa mudança cultural onde transexuais são reconhecidos como aquilo que são – cidadãos comuns com direito a uma vida digna que engloba respeito, trabalho, saúde e educação – não há como esperar uma mudança efetiva.

É por isso que a conversa no cotidiano é tão importante: ela é o ponto inicial para que sejam discutidas não só políticas públicas, mas também a importância de iniciativas privadas – como criação de políticas de D&I (diversidade e Inclusão) e educação continuada – e a revisão dos preconceitos individuais. Nos últimos anos, a produção de filmes e séries que retratam pessoas trans em suas individualidades também tem colaborado para a desmistificação desse espectro de sexualidade – bons exemplos são o filme Girl, de 2018; e alguns personagens da série Pose, da Netflix; e o documentário Laerte-se, que retrata uma das maiores cartunistas brasileiras.

Para que possamos evoluir enquanto país, é preciso que sejamos uma sociedade mais inclusiva e com mais equidade. A garantia dos direitos das minorias é fundamental nesse processo, e para que ela ocorra é preciso que o debate público continue avançando – incansavelmente.

*Anne Caroline Fernandes, professora de direito da Estácio e mestra em história. Texto-Colaboração/ blogdellas.

E-mail: redacao@blogdellas.com.br

Compartilhar