Cristina Tavares, exemplo na política – por Teresa Leitão*

 

Comemoramos, neste mês de junho, os 90 anos de nascimento de Cristina Tavares, jornalista e primeira mulher deputada federal por Pernambuco. Aguerrida, Cristina Tavares foi uma referência nas lutas democráticas no nosso estado e no país. Nascida em Garanhuns, a 10 de junho de 1934, filha de uma família tradicional e com boa condição financeira, desde cedo Cristina se dedicou a causas populares. Hoje, como primeira senadora de Pernambuco, mesmo com todo o tempo que separa nossos mandatos, posso dizer que tenho em Cristina uma grande inspiração.

Na Câmara, escolhida como vice-líder do PMDB, graças às ausências do titular, acabou por se tornar também a primeira mulher a liderar uma bancada na história do Parlamento brasileiro. O país vivia a abertura política, a transição para a redemocratização, depois de enfrentar a total falta de liberdade, quando brasileiros e brasileiras eram perseguidos pelo simples fato de discordarem do governo militar. 

Reeleita em 1982 e em 1986, pelo PMDB, Cristina foi atuante em todas as grandes discussões nacionais do período. Em 1984, lutou pelas Diretas Já e votou a favor da Emenda Dante de Oliveira, que previa eleições diretas para presidente da República. A emenda foi derrotada por pouco (precisava de 320 votos, teve 298). Por 22 votos, os brasileiros ainda não poderiam escolher seu presidente.

Mas Cristina não desanimou. Logo depois, em 1985, votou a favor de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral que escolheu o presidente da República, numa eleição indireta. Em seguida, foi relatora da Subcomissão de Ciência e Tecnologia e da Comunicação da Assembleia Nacional Constituinte, que elaborou a Constituição de 1988.

Ainda em 1988, Cristina Tavares foi uma das fundadoras do PSDB, sigla que surgiu a partir de uma cisão do MDB. Mas por discordar de algumas decisões do partido, no ano seguinte, ingressou no PDT. Foi por essa legenda que tentou um novo mandato em 1990, mas não conseguiu se reeleger.

Em 1986, Cristina Tavares descobriu que estava doente. Tinha câncer de mama. Daí em diante, conciliou a vida política com a luta pela vida. Um ano depois, o câncer já estava em processo de metástase. Depois que perdeu a eleição de 1990, passou a se dedicar só ao tratamento. Chegou a ir para os Estados Unidos em busca de tratamento mais avançado. Não adiantou. Em 22 de fevereiro de 1992, aos 57 anos, em Houston, no Texas, a guerreira Cristina Tavares nos deixou.

A última vez que vi Cristina foi em 1990, durante um ato público nas escadarias da antiga Secretaria Estadual de Saúde, na Praça Oswaldo Cruz, no Recife. Ela já doente, de bengala, fez questão de ir, para nos estimular. Eu iniciava minha militância sindical. Ela já tinha a experiência de três mandatos como deputada federal.

Para nós, mulheres da política, Cristina foi, antes de tudo, exemplo. E segue sendo um farol para todas nós. Ao celebrarmos os 90 anos de seu nascimento, mais que nunca, queremos dizer: Cristina Tavares, presente!

Formada em línguas neolatinas na Faculdade de Filosofia do Recife, optou depois pelo jornalismo, profissão em que ela entendia poder dar voz a quem não tinha voz nem vez. Atuou em veículos como o Jornal do Commercio, do Recife, o Diario de Pernambuco, o Diário da Noite, a revista Visão, este Correio Braziliense e O Pasquim. Para este último, em março de 1970, entrevistou Dom Helder Câmara em um momento em que a simples menção ao então arcebispo de Olinda e Recife representava um risco para qualquer jornalista.

Ainda na década de 1970, decidiu entrar para a política. Em 1978, foi eleita, pela primeira vez, deputada federal pelo MDB. No Parlamento, envolveu-se em todas as causas pelas quais entendia que valia a pena lutar. Os discursos na tribuna eram cheios de convicção e coerência. Suas bandeiras eram sempre os direitos humanos, a liberdade de imprensa, os direitos da mulher, a democratização, a reforma agrária, a justiça social e o desenvolvimento econômico do país. Denunciou torturas e desaparecimentos e atuou firmemente pela anistia, que veio em 1979.

Era, antes de tudo, corajosa. Uma vez, ao se referir a ela, Ulysses Guimarães soltou a seguinte frase: “Muitas calças do Congresso Nacional não valem as saias de Cristina Tavares”. Estávamos nos anos finais da ditadura que se instalara no país em 1964, e a definição de Ulysses fazia total sentido, pois eram poucos os parlamentares com a coragem que a deputada pernambucana exibia.

*Teresa Leitão é Senadora da República. Texto compartilhado do Correio Braziliense, em 04 de junho
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