Mediante ao convite para participar do Blog Dellas, fiquei surpresa e ao mesmo tempo lisonjeada, porque quando adolescente sonhei em ser jornalista e minha mãe me aconselhava a escolher uma profissão de “pobre”, pois na leitura dela na época, jornalismo era profissão de pessoas “ricas”. Hoje sou uma mulher preta, professora das redes públicas de ensino de Pernambuco e do Recife.

 

Aproveito, portanto, a oportunidade para escrever para este Blog com a finalidade de abordar contextos acerca do cotidiano de mulheres negras.

 

A militante: “Filhota da ditadura”

Para dar o pontapé inicial neste desafio convidei Marta Almeida Filha, para socializar sua história. Marta, filha do casal militante Ruberval Almeida e Marta Almeida, iniciou sua trajetória de militante quando criança, acompanhando seus pais. Na época era chamada de “filhote da ditadura”. “Nossos passos vêm de longe…” parafraseando Jurema Werneck, a sua trajetória de militância política teve influência da mãe que foi militante junto com Amparo Araújo no MR8 (Movimento Revolucionário 8 de Outubro), na luta pela redemocratização, ou seja, contra a ditadura militar instaurada no Brasil em 1964. O pai participou do Centro Teotônio Vilela, Causa Comum. Ou seja, filhota de uma família que participou da construção da militância de esquerda no Recife e no interior de Pernambuco, por meio dos movimentos populares, como: o Movimento de Cultura Popular-MCP, o Movimento Armorial, Pastoral popular e o movimento de articulação nos bairros.

 

 

Professora por opção

Aos 13 anos de idade , como estagiária, iniciou seus trabalhos na extinta biblioteca Comunitária José Carneiro de Albuquerque em Maranguape II, no município de Paulista, com Josebias e Anilda, mulher preta, referência para mim. O desejo do seu pai era que ela estudasse no CEFET (Centro Federal de Educação Tecnológica de Pernambuco, hoje IFPE (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco), onde era professor, mas “por opção mesmo”, escolheu ser professora. Fez o Magistério no Colégio Vera Cruz, a sua trajetória segue na educação quando passa no vestibular para o curso de Pedagogia e na Universidade de Pernambuco-Campus Mata Norte em Nazaré da Mata, onde também fez a Pós-Graduação em Psicopedagogia.

 

Movimento Negro

A caminhada militante com a família não para, foi com seus pais que participou de uma reunião do MNU (Movimento Negro Unificado de Pernambuco), na casa Cirilo. A partir daí ela adentra no Movimento Negro como coordenadora de mulheres. Período que começava a “pipocar as candidaturas negras, como Benedita da Silva, Vicentinho” e dava vontade de conhecer essas pessoas. Outras coisas muito fortes, como a Federação das Empregadas Domésticas, com a líder, Creuza, na Bahia, além dos blocos carnavalescos, Olodum, Ylê Aiê, tudo isso muito forte. Não que aqui não tivesse, porque quando adentrei ao MNU conheci os afoxés (Alafin Yoió, Lamento Negro), os maracatus, os terreiros, movimento cultural de resistência pela afirmação da nossa afrodescendência.

 

Marta Mãe: Todas as mulheres em uma só

Hoje, Marta é mãe de Talita com 8 anos de idade, e deseja que a “filhota” dê continuidade ao legado construído com a família, mesmo com a morte do seu pai, a sua casa tem um alicerce composta por mulheres pretas, que têm como princípio o bem viver na luta contra o eurocentrismo, o racismo, o patriarcado, pautado na história única, que desqualifica a dignidade humana das pessoas, como afirma Chimamanda Ngozi Adichie (2019, p. 27), “[…] A consequência da história única é esta: ela rouba a dignidade das pessoas. Torna difícil o reconhecimento da nossa humanidade em comum. Enfatiza como somos diferentes e não como somos parecidos.

 

Olinda, Maio de 2022.

 

Fotos-Acervo pessoal-Divulgação

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