A neurodiversidade e o direito de ser visto como pessoa

 

Abril marca o Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo e vou dividir com vocês um novo conceito social inclusivo, que acho muito legal. Dentro da amplitude necessária ao processo de inclusão, novos termos vão surgindo a partir da incessante busca de conceitos sociais mais humanos e justos, surgiu o neologismo “neurodiversidade”.

 

Ativistas das PcDs defendem o uso do temos para autistas, pessoas com deficiência mental ou transtornos, de forma que o ser humano deve ser visto como único e diverso, antes da sua condição. E também ser pessoa neurodiversa antes de suas características patológicas ou neurológicas e comportamentais.

 

Uma condição neurológica atípica devido a um transtorno comportamental ou mental não é tudo que nos define. É parte de nós. Por isto, devemos ser reconhecidos em nossa neurodiversidade, como oito bilhões de diferentes no mundo, cada um com suas limitações, percepções e cognição.

 

O conceito sugere uma vertente psicológica e psicopedagógica que interpreta o aprendizado, as deficiências e supereficiências de acordo com condições neurológicas distintas, resultantes de variações normais do genoma e desenvolvimento humanos.

 

Apesar de já ser antigo (o neologismo surgiu no final da década de 90) ele vem ganhando peso nas discussões atuais sobre inclusão e sobre a importância de termos mais inclusivos.

 

Antes de achar que tudo é uma bobagem ou mi mi mi, empatize-se e utilize as terminologias sugeridas pelas pessoas que vivenciam o processo e dos movimentos sociais que constantemente aperfeiçoam os termos, para, de forma pedagógica, ajudar a construir um ambiente social mais inclusivo e justo para todos.

 

Acesso ao lazer é direito

Semana passada o Festival Lollapalooza viralizou com uma notícia ruim que reverberou para muitos veículos de comunicação como Folha de S.Paulo, Revista Quem Acontece, jornal O Dia, Revista Istoé e muitos outros: a falta de acessibilidade do festival.

 

A denúncia partiu de duas influencers PcDs: Lorrane Silva (@_pequenalo) e Lorena Eltz         (@lorenaeltzz) que juntas possuem alguns milhões de seguidores. As influencers relataram como se sentiram inseguras e humilhadas pela falta de acessibilidade no festival, principalmente por não encontrarem banheiros adaptados em toda a área do Lolla e inúmeras barreiras para pessoas de mobilidade reduzida ou ostomizadas. Este assunto é de extrema importância, principalmente agora onde muitos produtores locais voltam a fazer grandes eventos e muitos não pensam em uma estrutura acessível para receber PcDs.

 

Vale lembrar que acessibilidade tem várias dimensões: além de física, ela é comunicacional e exige intérpretes de libras nos palcos traduzindo os shows, e também acessibilidade digital com o uso de tecnologias assistivas que tornam a comunicação digital e conteúdos de redes sociais acessíveis. Além disto, existem inúmeros recursos como a audidescrição para pessoas cegas. Desde 2015 a Lei Brasileira de Inclusão (lei 13.146/2015) garante este direito. Alguns eventos estão adotando práticas inclusivas e estrutura acessível, mas a grande maioria ainda não acordou para o fato de que PcDs também são consumidores, que são numerosos e querem respeito.

 

Cadastro-Inclusão

O Governo Federal lançou em março o Cadastro Inclusão, ferramenta que possibilitará a emissão de um certificado para comprovar a condição de pessoas com deficiência (PcDs). Facilitará porque a pessoa com deficiência não precisará reunir diversos documentos para ter acesso a políticas públicas e inclusive, peregrinar repetindo exames e laudos para provar a sua condição por várias vezes . A certidão pode ser retirada por meio do aplicativo Meu INSS.

 

Violência contra crianças com deficiência é tema de pesquisa

A Folha de S.Paulo destacou em uma grande matéria uma pesquisa global com índices de violência contra crianças com deficiência. Este tema precisa ser debatido e a criação de políticas públicas para erradicar a violência é urgente. Pernambuco está atrasado nesta pauta, deveria replicar o exemplo do governo de São Paulo, que em 2014, no então Governo de Geraldo Alckimin criou a Delegacia da Pessoa com Deficiência e além disto, implementou a qualquer boletim de ocorrência um código para identificar no boletim e ocorrência se a pessoa que sofreu a violência é PcD ou não.

 

Criar uma delegacia custa dinheiro mas eu pergunto: custa dinheiro implementar um código ao BO? Não. Basta inteligência inclusiva e vontade. Com esta simples medida São Paulo passou a gerar estatísticas anuais sobre a violência contra PcDs. Este exemplo e tantos outros poderia ser replicado aqui em Pernambuco. A matéria reforça a importância da criação de “programas de apoio para crianças e jovens com deficiência vítimas de violência”. E também para o acolhimento aos pais, que, pela inexistência de uma rede de apoio, ficam esgotados e negligenciam a criança. Outra violência citada é a social: a falta de acesso à saúde e a invisibilidade. Políticas para pessoas com deficiência precisam ser prioridade de verdade.

 

Daniela Rorato é ativista que atua em Defesa dos Direitos das PcDs, empreendedora social e consultora em acessibilidade.
 
 
Foto e imagens/Divulgação
 
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