O que está em questão não é a liberdade de expressão, mas o respeito às leis brasileiras – Por Míriam Leitão*

 

O ministro Alexandre de Moraes levou para o julgamento virtual da primeira turma do Supremo Tribunal Federal (STF) a suspensão da operação do X (antigo Twitter) no Brasil. O ministro Flávio Dino já o acompanhou, faltam mais três votos, mas a perspectiva é que Moraes seja acompanhado por todos. É preciso entender que o que está em discussão não é liberdade de expressão no Brasil.

O Brasil é uma democracia e há liberdade de expressão. O que está em jogo, primeiro, é o respeito à lei empresarial brasileira, que diz que só pode atuar no país quem tiver representante legal por todas as necessidades de diálogo com o governo, com as instituições e a sociedade. Esse é o primeiro ponto, há ilegalidade na atuação do empresário Elon Musk. Quando retira todos os representantes legais da empresa do país, Musk afronta uma lei brasileira que, diga-se de passagem, sempre funcionou. Não pode não ter uma empresa que faz negócios no Brasil, vende serviços a brasileiros, opera no mercado, mas não tem representante legal no país.

O segundo ponto é que Elon Musk está querendo estressar esse assunto, transformá-lo em um debate por liberdade de expressão, quando trata-se de uma batalha global para organizar a atuação das redes sociais, do mundo virtual, com as mesmas leis que regem o mundo físico. Não por acaso, a suspensão do Twitter (ou X) pela Corte brasileira ganhou atenção no mundo inteiro. O jornal New York Times, ao tratar do assunto na sua edição impressa, destaca que esse era o segundo grande conflito em uma semana entre governos e redes sociais. O jornal americano relacionou o caso brasileiro à prisão do fundador e CEO do Telegram, Pavel Durov, anunciada pelas autoridades francesas, o que mostra que esta não é uma questão brasileira, o mundo inteiro está vivendo esse conflito.

No Brasil, o Congresso Nacional, ao não aprovar a regulamentação das redes sociais, agrava essa situação e deixa o país desprotegido. O projeto foi engavetado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, que, depois de estar tudo pronto, tramitado, criou uma comissão para rediscutir o regramento e, desde então, não se tem mais notícia da regulamentação. Quando Lira faz isso, deixa o Brasil desguarnecido numa guerra que é fundamental para que a lei prevaleça. O conjunto das leis do Brasil está sendo desrespeitado por plataformas que não querem seguir, por exemplo, a ordem de um ministro do Supremo. Não se descumpre ordem judicial, isso é um princípio internacional.

Há 20 milhões de brasileiros que usam o X, alguns estão buscando alternativas, outras plataformas, mas o fato é que há quem goste desse ambiente de troca de opiniões, ainda que seja uma rede há muito tempo sem moderação, onde há muito desrespeito à lei. Mas o fato é que, cumprida a ordem judicial, a rede social será reativada. Numa democracia, a lei precisa prevalecer. É fundamental a apreciação da decisão do ministro Alexandre de Moraes pelo colegiado da 1ª Turma do STF, porque essa não pode ser uma batalha de Moraes contra Musk, mas do Supremo contra uma plataforma que não quer respeitar os limites legais do país.

*Miriam Leitão é jornalista e escreve para o Jornal O Globo.

E-mail: redacao@blogdellas.com.br

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